quinta-feira, 8 de março de 2012

Especialista explica como funciona a censura na web


Ethan Zuckerman analisa como diversos países lidam com a internet

por Guilherme Rosa
Wikipedia
Crédito: Wikipedia/Divulgação
A batalha em torno da liberdade de expressão na internet está cada vez mais evidente. Em países como Síria e Vietnã, que censuram o conteúdo de sites, governos combatem ativistas pelo controle do que é dito na web. Mesmo em locais como os Estados Unidos, onde os discursos políticos não são censurados, novas leis como o SOPA são propostas para controlar o que seus cidadãos postam em redes sociais e blogs. 


Para entender exatamente o que se passa nessa disputa, a GALILEU entrevistou Ethan Zuckerman, especialista em liberdade de expressão na internet, fundador de grupos como o Geekcorps e Global Voices e diretor do Centro de Mídia Cívica do MIT. A seguir, ele explica como funciona a censura na internet: 

O que exatamente aparece na tela de um computador quando uma pessoa tenta acessar um conteúdo censurado? 

Depende. Normalmente, você vê uma página de bloqueio. Por exemplo, na Arábia Saudita, eles são muito honestos quanto a isso. Eles dizem: “este conteúdo está bloqueado, se você acha que cometemos um erro, pode apelar”. São transparentes quanto à censura. Mas alguns países simplesmente mentem quanto a isso, e mostram páginas de erro. A Tunísia, por um longo tempo, mostrava a página de erro do Internet Explorer, mesmo se você estivesse usando o Chrome ou Mozilla. A página estava em francês, mas escrita com erros. Eles tentavam disfarçar a censura e fazer o usuário pensar que o navegador estava com problemas. É como muitos governos gostariam que as pessoas se sentissem. 

Como funciona a censura nesses países? 

Em um país como a China, a internet é censurada de 3 modos. Primeiro, o governo bloqueia o acesso a certos sites. É muito difícil acessar o Twitter, por exemplo. Em segundo, há censura extensiva nas ferramentas que a maiorias dos usuários têm acesso. Então, ao invés de usar Twitter, os chineses usam o Weibo, onda há certos termos que não poderão usar. Se usar, sua conta será fechada. O terceiro modo é encorajando a visão nacionalista para dominar as conversas na internet, tornando mais difícil colocar outras opiniões. 

Quando falamos em se livrar da censura, falamos de uma tarefa especializada. Se você quiser acessar Twitter na China, você vai precisar de um proxy [servidor que permite conectar-se a computadores no exterior, livres da censura]ou um software como o Tor. Alguns chineses que querem ter contato com a audiência internacional escolhem fazer isso. O problema é que se você for um usuário chinês e usar o Twitter, você vai falar com americanos, brasileiros e europeus, mas não estará falando com chineses, porque eles usam Weibo. Então você pode pensar como se o país tivesse duas internets. Uma domestica controlada principalmente pela censura e outra internet internacional para quem domina a tecnologia. 

Essas ferramentas para driblar a censura têm suas limitações? 

O que essas ferramentas são boas em fazer é passar pelo primeiro tipo de censura, quando o país diz que você não pode acessar um tipo de conteúdo. Essas ferramentas são perfeitas para isso, mas muito lentas. Outro problema é que elas quebram algumas páginas, páginas muito interativas, que usem Java. 

O grande problema com essas ferramentas é que são muito pouco usadas. Fizemos um cálculo um ano e meio atrás e tentamos descobrir quantos usuários em países que censuram a internet as usam. Chegamos à estimativa de 3%, o que é menor do que esperávamos. Ficamos surpresos, mas parece que muitos chineses pensam: “Que chato não conseguir acessar o Twitter, mas todos os meus amigos estão no Weibo. Então é com isso que me importo”. Isso é mais comum do que pensamos. 

Esses governos teriam como saber quem tenta acessar algum site proibido? 

Não seria muito difícil para eles saberem quem quer acessar esses conteúdos, mas não temos visto esses governos perseguindo esse tipo de usuário. Eles seguem os agitadores e ativistas, não os cidadãos comuns que buscam informação. Essa não a principal ameaça para eles. Há muitas histórias de governos prendendo gente por postar coisas na internet. 

Então o governo, além de proibir o acesso a certos sites pode partir para uma censura mais... física, prendendo seus cidadãos? 

Nós já discutimos 3 formas de censura. Existem mais duas formas importantes. Uma é intimidando as pessoas, fazendo elas sentirem medo de criar conteúdos e de escrever online. Outra forma é fazendo ataques contra sites que te incomodam. 

Alguns paises usam só um desses modos? 

Claro. Por exemplo, a Rússia é boa em alguns tipos de censura, mas não se envolve com outros. Ela muito raramente bloqueia o acesso a conteúdos. Mas eles intimidam pessoas, principalmente jornalistas. Eles promovem vozes pró-governo e fazem ataques de negação de serviço a algumas páginas. É interessante que eles não sintam necessidade de usar a censura de modo tradicional, uma vez que as outras ferramentas são tão eficientes.



Como você vê o SOPA nessa discussão sobre censura? 

É importante perceber que quase todos os paises tentaram controlar os discursos na internet de algum modo. Nos EUA não há controle na fala política, porque isso é proibido pela constituição. Mas há um modo de controlar o discurso comercial, que viole os direitos autorais. Se eu usar o Twitter e colocar o endereço de um vídeo com direitos autorias, eles podem retirar meu link do ar, há mecanismos na lei americana para isso. No entanto, os mecanismos que os EUA estão querem colocar em prática com o SOPA podem ser usados por outros países para tentar controlar discursos políticos. A China pode querer tirar um conteúdo do ar porque ele viole o copyright do partido comunista, por exemplo. 

Mas as principais críticas contra o SOPA são os compromissos necessários para ele funcionar. Você poderá processar o Twitter por conta de algo que um de seus usuários fez. Esse compromisso fez com que muitas empresas fossem contra a lei. O Youtube talvez nunca existisse se eles fossem responsáveis pela publicação de material com direitos autorais. Isso poderia acabar com as inovações na web. 

Então os dois lados têm interesses financeiros? 

Claro. Os detentores dos direitos autorais querem tirar a pirataria do ar. Eles podem estar certos ou errados (alguém pode dizer que a pirataria abre mercados, pode dizer que ela abre novos modos de negócios), mas acham que a pirataria é uma ameaça ao seu negócio. O Google por outro lado pensa que se puder ser processado só porque sua busca tem um link para um conteúdo pirata, será um perigo ao seu negócio. Dos dois lados há empresas ameaçadas. O interessante é notar que nos Estados Unidos os usuários começaram a lutar em favor dessas companhias da web. Eles simplesmente disseram: “nós gostamos do Tumblr, Twitter e Google. E vamos pressionar nossos legisladores contra a SOPA.” Pouquíssima gente ficou a favor dos estúdios e gravadoras. 

Essa postura dos usuários pode ser vista como uma mudança de geração? 

Pode sim. Para meus pais, poderia ser legal ir trabalhar para uma grande gravadora. Mas para a minha geração o legal seria começar uma companhia de internet. É uma mudança cultural sobre o que é legal e excitante. 

Mas agora que o SOPA caiu essa discussão acabou? 

O interessante é que logo que a lei foi retirada de votação, o Departamento de Justiça americano atacou o Megaupload, um negócio que parecia estar fazendo muito dinheiro com pirataria. Você pode ver esse ataque como um modo de dizer que os EUA não precisam de novas leis, eles já são capazes de ir atrás dos donos dessas companhias usando as atuais. 

É importante entender que o debate sobre o SOPA não é o mesmo da censura em paises como a China. Eles costumam ser citados juntos porque usam algumas técnicas parecidas, mas é importante reconhecer que há diferenças entre os dois e que cada discussão terá de ser ganha usando argumentos diferentes.

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